Até onde vai a influência da luz na nossa fisiologia?

Sempre que uma nova tecnologia é introduzida, muitos são os questionamentos a respeito principalmente dos benefícios incorporados, entendidos como “prós”, assim como das desvantagens, aqui apontadas como “contras”.

Os LEDs que conhecemos e utilizamos largamente hoje são diodos semicondutores que geram luz azul e revestidos por fósforo, o que resulta na transformação dos fótons azuis em fótons com comprimentos de onda maior, na faixa do verde, amarelo e vermelho, que o nosso sistema visual-cerebral interpreta como luz branca.

Em função da tecnologia utilizada para a fabricação de LEDs brancos através da conversão por fósforo – PCLED – temos como característica principal a maior concentração de energia na faixa da luz azul, compreendida entre 400 a 500nm, quando comparado com outras tecnologias de geração de luz branca com o mesmo valor de temperatura de cor.

Como exemplo, uma lâmpada incandescente com temperatura de cor de aproximadamente 2700K tem algo como 3 a 4% de energia de luz azul. Um LED também de 2700K apresenta algo como 12 a 15% de energia na luz azul. Ou seja, podemos obter o mesmo aspecto da luz branca gerada por fontes de luz distintas, porém com distribuição espectral de potência (espectro da luz) totalmente diferentes.

Quando falamos de luz, devemos considerar seus aspectos visual e não visual. O aspecto visual tem relação com a parte fotométrica da luz, e o aspecto não visual diz respeito à parte radiométrica da luz, pois, como sabemos, a luz é uma onda eletromagnética e, portanto, carrega energia.

A temperatura de cor nada mais é do que um parâmetro fotométrico, baseia-se somente no aspecto visual da luz. No entanto, devemos também considerar a distribuição espectral de potência (onde temos algo similar à nossa impressão digital), que define exatamente o comportamento do nível de energia contido em cada comprimento de onda da luz visível compreendidos entre 380 a 780nm.

Falando de energia, devemos considerar três parâmetros importantes:

  1. A distribuição espectral de potência, também conhecida como o espectro da luz, define exatamente quanto cada comprimento de onda carrega de energia.
  2. A quantidade de energia ou dose gerada pela fonte de luz, fazendo uma analogia com a iluminância, ou seja, quanto maior a dose, maior será a iluminância.
  3. O fotoperíodo, que representa o tempo de exposição na fonte de luz.

Portanto, analisando os efeitos não visuais da luz, temos que nos preocupar com o tipo de luz que estamos recebendo (espectro), com a intensidade da luz (dose ou iluminância) e com o tempo de exposição em função do horário. Sabemos que durante o dia o recomendado é que quanto maior for a composição de comprimentos de ondas curtos (luz fria) e maior iluminância, melhor para a nossa saúde e que, à noite, quanto maior for a composição de comprimentos de ondas longos (luz quente) e menor iluminância, melhor para nossa saúde.

Concluímos, então, que a melhor situação é mais luz azul durante o dia e menos luz azul durante a noite. No entanto, isso é somente uma parte da equação. Vamos hipoteticamente analisar uma situação onde à noite tivéssemos somente a iluminação feita pela lua e pelas estrelas, sem nenhuma luz elétrica utilizada. Ao analisarmos o espectro da luz tanto da lua como das estrelas, vamos concluir que se trata de espectros frios, ou seja, acima de 4500K, com alta concentração de comprimentos de ondas curtos, porém com baixa iluminância. Neste caso, estamos falando de um ambiente totalmente natural com espectro de luz fria.

Outro fator que devemos analisar, além do espectro da luz e da iluminância, são as métricas mais importantes utilizadas hoje na iluminação integrativa que são o CS – Circadian Stimulus – e o EML – Equivalent Melanopic Lux. No caso específico do CS, embora seja uma medida de supressão de melatonina, pretende-se que seja relevante para a regulação dos ritmos circadianos. Apesar dessas métricas apresentarem algumas diferenças, ambas se baseiam no espectro da luz e na iluminância medidos no plano vertical do olho humano.

A razão principal desse artigo é o fato de que temos observado vários questionamentos a respeito da utilização de luz com alto conteúdo de comprimentos de onda na faixa do azul à noite, principalmente em produtos como o kit estrelado com fibras óticas, normalmente instalados em quartos com crianças.

A pergunta a ser feita é: “Será que esse tipo de situação onde temos uma criança sendo exposta a uma iluminação noturna feita pelo kit estrelado com fibras óticas estaria sujeita a uma alteração do seu ritmo circadiano?”

Para responder a essa pergunta, fizemos um ensaio prático utilizando um kit estrelado com fibras óticas e analisamos os resultados medindo o CS – Circadian Stimulus – em uma instalação onde a criança estaria sendo iluminada somente por essa fonte.

Para a realização desse ensaio, foi considerado um quarto com dimensões de 3,5 x 3,5 metros, com pé-direito de 2,60 metros, que acreditamos ser um ambiente extremo, pois, na maioria dos casos, normalmente o pé-direito seria maior do que 2,60 metros. A cama foi posicionada no centro do quarto, por entendermos ser a condição mais extrema, uma vez que, em uma situação real, os olhos da criança estariam mais próximo de uma das quatro paredes do ambiente. A criança foi posicionada deitada na cama, e a distância considerada do plano dos olhos ao piso foi de 0,60 metros.

Nessa condição, posicionando o espectrofotômetro na altura dos olhos da criança e alinhando com as fibras óticas posicionadas no teto, com a sala totalmente escura, foram realizadas as medidas colorimétricas e fotométricas.

Abaixo apresentamos os valores que consideramos mais importantes:

  • TC: 3011K
  • CIE1931 x: 0,4331
  • CIE1931 y: 0,3976
  • IRC (Ra): 74
  • TM-30-18 Rf: 76
  • TM-30-18 Rg: 95
  • Duv: -0,0021

Foi também medida a iluminância, nas condições acima expostas, e o valor encontrado foi zero lux. O equipamento utilizado não foi capaz de registrar um valor devido ao fato de a iluminância ser muito baixa. A distribuição espectral de potência também foi levantada a fim de ser utilizada juntamente com a iluminância na ferramenta do CS – Circadian Stimulus, com o intuito de levantarmos o valor de CS e comparar com a métrica que consta na norma UL24480.

Independentemente de o valor medido ter sido igual a zero, para fins de cálculo do CS, assumimos uma situação extrema e adotamos a iluminância de 5 lux a ser aplicada em conjunto com a distribuição espectral de potência na ferramenta CScalculator disponível no site www.lrc.rpi.edu/cscalculator.

Na Figura 1, podemos notar que, considerando a distribuição espectral de potência do kit estrelado com fibras óticas e a iluminância de 5 lux, bem acima do valor real medido, obtemos o valor de – CS Circadian Stimulus – de 0,005. Comparando esse valor com a norma UL 24480 que correlaciona o valor de CS à supressão de melatonina, concluímos que a porcentagem de supressão é igual a 0,5%, e a norma especifica que, a partir das 20h00, pode-se admitir até 10% de supressão de melatonina.

Conclusão
Ao se considerar somente a porcentagem de luz azul no espectro, podemos chegar a conclusões não corretas, visto que devemos analisar o conjunto espectro/iluminância para avaliar a real porcentagem de melatonina que está sendo suprimida pelo nosso organismo. No presente caso, mesmo utilizando uma fonte de luz de 3000K com algo ao redor de 15% de energia na faixa da luz azul, o produto não exerce influência no ritmo circadiano durante o período da noite.

Outro aspecto não visual também considerado neste ensaio e que entendemos como muito importante para o ser humano é o emocional, enfatizando o bem-estar das pessoas em um ambiente iluminado. Não resta a menor dúvida que dormir em um ambiente que simula o céu à noite, apreciando o movimento das estrelas, traz a sensação de paz e conforto, principalmente quando essa iluminação não exerce qualquer influência no nosso ritmo circadiano.

Os ensaios foram realizados nos laboratórios da FASA Fibra Ótica, em março de 2024.

Equipamentos utilizados:

  • Kit Estrelado LYRA 120 pontos – Fabricante: FASA Fibra Ótica
  • Multímetro modelo MLM-1020 – Fabricante: Minipa
  • Espectrofotômetro portátil modelo ALP-01 – Fabricante: Asensetek

Sobre o autor

>> Vicente Scopacasa é engenheiro eletrônico com pós-graduação em Administração  de Marketing. Tem sólida experiência em semicondutores, tendo trabalhado em  empresas do setor por mais de 40 anos. Especificamente em LEDs, atuou por mais  de 30 anos em empresas líderes na fabricação de componentes. Atua, hoje, como  consultor na área de iluminação de estado sólido e como professor em cursos de  especialização e pós-graduação em iluminação.

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